EUROPA E PORTUGAL
2030
Moção temática dos deputados do PSD ao Parlamento Europeu
40º Congresso do PSD - Porto 1, 2 e 3 de julho 2022
INTRODUÇÃO E SÍNTESE
O PSD tem sido o alicerce essencial, permanente e incondicional da opção portuguesa pela integração na União Europeia e na NATO. Nunca fez alianças nem concessões a partidos que põem em causa estes dois pilares da nossa afirmação soberana. A guerra de agressão em curso impôs uma mudança geopolítica de grande alcance na Europa e no mundo que só confirma as opções fundamentais de Portugal e do PSD pelo projecto europeu e pela aliança atlântica. A presente moção reafirma esta opção do PSD e identifica as prioridades políticas que consubstanciam e renovam o compromisso europeu de Portugal.
A crise pandémica já reforçara a necessidade de uma integração mais profunda, mas a guerra repôs a paz e a segurança como os desígnios primeiros da UE e relançou o tema do alargamento ao Cáucaso e aos Balcãs. As lições entretanto aprendidas com a crise da zona euro, a crise dos fluxos migratórios e a ocorrência do Brexit também apontam para um aprofundamento da integração.
O PSD defende, pois, a atribuição de novas áreas de competência à UE, devidamente articulada com a dimensão nacional, por exemplo e designadamente, na área da saúde, da energia, da defesa, da demografia e da protecção civil. O PSD apoia uma reforma dos tratados que, para lá destes novos domínios, fortaleça a legitimidade democrática das instituições europeias, a sua responsabilidade política, a sua proximidade aos cidadãos e simplifique o processo de decisão (já antecipando os efeitos institucionais e decisórios dos novos alargamentos).
Esta reforma e os seus desenvolvimentos não devem afectar aqueles que são os três desafios fundamentais da UE: (1) potenciar o crescimento económico para garantir o bem-estar social dos cidadãos europeus e a coesão territorial dentro da UE; (2) dar prioridade ao combate às alterações climáticas e à descarbonização no sentido de assegurar a sustentabilidade ambiental de todas as políticas da UE e de manter a liderança global neste domínio; (3) apostar na ciência, na tecnologia e na inovação, promovendo a transição digital e ambicionando uma futura liderança global na esfera digital. A concretização de todos estes objectivos obriga a um incremento do orçamento da União, só possível com a criação e mobilização de recursos próprios. A aposta no crescimento sustentável mas efectivo, tornando a Europa mais competitiva e mais rica, é a única via de promover e valorizar a Europa social, a Europa dos direitos sociais. O modo de vida europeu – que justamente concilia a prosperidade económica com o bem-estar social – só pode ser atingido e defendido com um crescimento sólido. Não há nem pode haver Europa social sem prosperidade económica, sem um crescimento sólido e sustentado. Quem verdadeiramente quer uma Europa social tem de defender uma Europa competitiva.
Todas estas reformas deverão fazer-se mantendo e reforçando o respeito pelo princípio do Estado de Direito (rule of Law), pelos direitos fundamentais e pelos princípios estruturantes da democracia na União e em todos os Estados-membros. A primazia dos valores e do direito é uma “pegada europeia” que em tudo corresponde à marca de água do PSD e da sua apologia impostergável do personalismo. O personalismo que é incompatível com uma visão liberal que se fia no mercado sem curar do equilíbrio social e com uma visão socialista que apregoa a igualdade sem cuidar do crescimento da economia. Na Europa e em Portugal, o PSD tem como desígnio a defesa do “modo de vida” especificamente europeu, que preconiza a economia social de mercado, com a pessoa humana, os seus direitos e os seus valores no centro da acção política.
Com esta visão europeia e europeísta, o PSD estará em condições de proporcionar um futuro melhor a todos os portugueses e de, em particular, dar às gerações mais jovens a oportunidade de realização e de sucesso que lhes tem sido negada nos anos mais recentes.
MOÇÃO
Proposta Temática
I
DEFESA
O PSD aplaude a criação de um pilar europeu de defesa no seio da UE, sem estabelecimento de um exército único e que actue em estreita coordenação com a NATO (ou até dentro do seu quadro). A UE, sem abandonar a cooperação transatlântica, tem de ser capaz de assegurar a sua defesa e proteger os seus cidadãos. Este pilar implicará o (1) estabelecimento de compras conjuntas de material militar, (2) a aposta na coordenação da investigação e na harmonização e integração da indústria de defesa e (3) a criação de forças operacionais de intervenção rápida.
II
DEMOCRACIA
Tendo em vista o cenário do pós-guerra, propomos a organização de uma conferência que defina os princípios e os termos de uma nova ordem de segurança e paz na Europa. Apoiamos, sem reservas, a concessão imediata do estatuto de país-candidato à Ucrânia (e a outros Estados sob ameaça), bem como a preparação do plano internacional de reconstrução. Aquela conferência deve curar das modalidades de integração dos diferentes Estados sem necessidade de criar uma nova organização e revisitando os critérios de adesão à UE. Para tanto e para outros fins como a saúde, a energia, a proteção civil, a agilização de procedimentos e o reforço da democracia com eventual inversão de competências na nomeação do Presidente da Comissão, concordamos com uma revisão dos tratados. Não deve, porém, esquecer-se que é ainda possível fazer enormes progressos sem alterar os tratados vigentes (veja-se o PRR financiado com dívida comum, a aquisição conjunta de vacinas, a compra de equipamento militar para ajudar a Ucrânia, a solidariedade na maior vaga de refugiados).
III
ORÇAMENTO
Os novos desafios que enfrenta a UE, as novas competências e os novos instrumentos (por exemplo, o Next Generation EU – PRR) de que possa ser dotada reclamam um orçamento europeu reforçado. O orçamento europeu continua circunscrito a cerca de 1% do PIB da UE. São necessárias receitas próprias (que não são “impostos europeus”) como o mecanismo de ajustamento de carbono nas fronteiras, as receitas do mercado de licenças de emissão, a taxa sobre os plásticos, a taxação dos gigantes do sector digital e ainda das transações financeiras. Quem beneficia do mercado interno deve naturalmente pagar pelo acréscimo de valor que cria em razão desse mercado. É necessário evitar as enormes perdas em fraude, evasão e elisão fiscal, que equivalem, anualmente, a sete orçamentos da UE, ou seja, cerca de 1 bilião de euros. Os novos recursos próprios são mais urgentes a partir do momento em que a UE aceitou contrair “dívida comum” para construir o NGEU, a “bazuca europeia” (que, aliás, pode repetir-se para fazer frente aos efeitos da guerra). Se não se encontrarem receitas próprias, terá de haver um corte substancial nos fundos e programas do orçamento da UE, havendo o perigo de afectarem a política de coesão e a política agrícola comum.
IV
AUTONOMIA ESTRATÉGICA
A pandemia e a guerra mostraram a urgência de aUE assegurar a sua autonomia estratégica (impropriamente apodada de “soberania europeia”) em sede de produção de bens essenciais e de aprovisionamento energético. O PSD defende que o desígnio da autonomia estratégica europeia seja um princípio transversal a todas as áreas e um instrumento da afirmação geopolítica global da UE e dos seus valores.
V
ENERGIA
A criação de uma união da energia constitui uma pedra angular dessa autonomia, a realizar (1) pela consolidação da rede de interconexões energéticas à Península Ibérica, especificamente acelerando as ligações elétricas previstas para o final da década e recuperando os projetos de interconexões a gás, passíveis de utilização futura para hidrogénio), (2) pela aposta maciça nas energias renováveis, na eficiência energética, na descarbonização e no recurso ao hidrogénio (transição energética) e (3) pela diversificação de fontes de abastecimento (redução do risco político). Atendendo aos custos da transição energética e a outros conjunturais (guerra), a redução da carga fiscal sobre a energia é o meio de aliviar o impacto económico-social sobre as famílias e as empresas.
VI
SAÚDE
A criação de uma união para a saúde é também um imperativo estratégico para a UE, como bem mostrou a pandemia, no esforço colectivo de investigação e aquisição de vacinas e na partilha de pacientes e de meios. Deve centrar-se na “relocalização” da capacidade produtiva de medicamentos e equipamentos médicos, na criação de centros europeus de excelência de investigação e tratamento nas várias áreas, na eliminação das barreiras de acesso de cidadãos europeus aos sistemas nacionais, no estabelecimento de políticas comuns de saúde pública, de prevenção e de combate a ameaças transfronteiriças. Estes objectivos implicam uma redefinição dos mandatos e dos poderes do Centro Europeu de Controlo de Doenças e da Agência Europeia do Medicamento.
VII
DEMOGRAFIA
Os desafios demográficos, partilhados pelos 27 Estados-membros, postulam a adopção de políticas comuns nas migrações, nas questões da longevidade e, sobretudo, na natalidade. É urgente a aprovação de uma Estratégia Comum para a Natalidade, através de políticas com impacto directo no pilar social, designadamente nas áreas da saúde, segurança social e educação numa abordagem integrada de apoio às famílias e à infância. Na dimensão da longevidade, é fundamental garantir “qualidade” ao aumento progressivo da esperança média de vida. Para tanto, devem promover-se as políticas de envelhecimento ativo e a chamada “economia prateada”, que assegurem a esta faixa etária níveis de rendimento, actividade e envolvimento social activo que propiciem e incrementem a “qualidade” no período final de vida. Na área altamente sensível das migrações, propugnamos uma política comum assente na solidariedade e na responsabilidade dos Estados Membros. Portugal e a UE devem promover a direito ao asilo dos refugiados, a integração dos imigrantes, a “atração de talento(s)” por via migratória e incentivos que favoreçam o regresso de portugueses emigrados. Devem também combater a imigração irregular e o tráfico de pessoas e garantir a defesa das fronteiras externas da UE.
VIII
COESÃO
As especificidades territoriais das diversas Regiões Europeias, em particular as das Áreas Rurais ou de Baixa Densidade e, bem assim, das regiões ultraperiféricas (Açores e Madeira), têm de ser tidas em conta em todas as políticas europeias. A promoção da coesão territorial passa por medidas como a conectividade em banda larga de alta velocidade, a difusão das competências digitais, níveis adequados de serviços públicos e privados, soluções de mobilidade inovadoras, bem como a utilização de fontes energéticas alternativas, a diversificação económica, o empreendedorismo e uma forte criação de emprego. No plano das acessibilidades, defendemos o reforço das ligações ao interior, sobretudo através da ferrovia. A ligação ferroviária a Espanha é determinante (sobretudo para o transporte de mercadorias), também por óbvias razões ambientais. Perante os desafios da descarbonização, é urgente reforçar os postos de carregamento eléctrico e a oferta de transporte público ambientalmente sustentável. A posição geográfica periférica e a vocação turística do nosso país exigem a construção de um novo aeroporto na região de Lisboa quecumpra as exigências de sustentabilidade em todos os parâmetros, incluindo o dos combustíveis.
IX
COMPETITIVIDADE
Os governos socialistas têm prosseguido políticas económicas que arrastaram Portugal para a cauda da Europa. Temos sido sistematicamente ultrapassados por outros Estados-membros em sede de criação de riqueza e de crescimento económico. Estas opções políticas erradas têm enormes consequências sociais, degradando a prestação e o desempenho do nosso Estado social (designadamente na saúde, mas também na educação, na segurança social e nos serviços públicos em geral). Não se pode distribuir a riqueza que não se cria. Por isso, são absolutamente cruciais as políticas de crescimento, com alívio fiscal e aumento da competitividade e produtividade. Esta vaga de crescimento passa pela digitalização da economia e dos serviços públicos, pela reindustrialização, pela aposta na agricultura e no princípio da “soberania alimentar”, pela valorização dos recursos marinhos e pela conclusão da transição energética. A indústria do Turismo continuará a ser uma das alavancas da nossa economia nos próximos anos. A modernização do sector implica a transição digital, o recurso à automação e o respeito pelos critérios de sustentabilidade. A criação de uma Agência Europeia para o Turismo, responsável pela definição de métricas comuns, recolha e tratamento de dados, é um passo necessário para a desejável criação de uma União para o Turismo. Já na transição digital, é decisivo levar a cobertura das redes 5G a todo o território e investir na formação digital básica de toda a população. As políticas económicas devem orientar-se para a criação e qualificação do emprego, aumentando o rendimento disponível das famílias. A qualificação do emprego passa pela formação e pela digitalização, dando-se prioridade aos programas de mobilidade estudantil e laboral, que constituem um dos activos mais valorizados pelos cidadãos europeus. Só assegurando um crescimento acima da média europeia e gerando emprego, se pode aumentar o rendimento dos trabalhadores e sustentar o Estado Social português, cada vez mais solicitado (atento o envelhecimento da população e o que ele exige do sistema de saúde e de prestações sociais). Não há nem pode haver Europa social sem um crescimento sólido e sustentado. Quem verdadeiramente quer uma Europa social tem de promover e fomentar uma Europa competitiva.
X
AGRICULTURA E PESCAS
Como ilustra a crise alimentar gerada pela guerra, as políticas agrícola e de pescas são um pilar determinante da autonomia estratégica da UE. Também com esse objectivo, deveremos promover mais ativamente os alimentos produzidos na UE, que obedecem às melhores práticas ambientais, sociais e de qualidade do mundo. A sustentabilidade económica, ambiental e social deve ser o princípio chave da actividade agrícola, florestal, extractiva e piscatória, contribuindo nomeadamente para a utilização eficiente da água, o aumento da matéria orgânica nos solos e a descarbonização. Na exploração marinha, na protecção das espécies e na escolha das prioridades produtivas a aposta na investigação científica e nas tecnologias digitais é imprescindível para garantir o uso sustentável de todos os recursos naturais.
XI
AMBIENTE
As políticas de ambiente e, em especial, o Pacto Ecológico (conhecido como Green Deal) são a trave mestra das grandes reformas que a UE fará nas próximas décadas. O PSD revê-se por inteiro nos objectivos para a redução das emissões em 55% até 2030 e para a neutralidade carbónica em 2050. Para tal, é fundamental electrificar o sector da energia, descarbonizando a sua produção, avançar com a definição de “go-to zones” para renováveis de licenciamento expedito, electrificar o sector da mobilidade e promover o hidrogénio enquanto alternativa industrial. Portugal corre o risco de ver mais de metade do seu território desertificado por efeito das alterações climáticas, sendo assim urgente a adaptação da sociedade a esta realidade e aos fenómenos climáticos extremos. Nas cidades, evitando ilhas de calor, e nas zonas rurais, optando por espécies que melhor se adaptem aos efeitos do aquecimento global. O ambiente e a economia não são interesses inconciliáveis, aliás, o desafio ambiental e climático tem de ser convertido numa grande oportunidade económica de crescimento e geração de emprego. O fomento da economia circular, também pela via fiscal, deve ser prosseguido em todos os sectores, reduzindo a exploração dos recursos naturais.
XII
DIGITAL
A dupla transição verde e digital está no centro das políticas europeias e a sua concretização não será possível sem um forte investimento na Ciência e na Inovação. Sendo a proteção dos recursos marinhos e hídricos um dos pilares do Pacto Ecológico Europeu, o PSD conseguiu ver aprovada a criação de uma entidade dedicada à investigação científica e à inovação na área da água (Centro de Conhecimento e Inovação para a Água) e tem-se batido para que esta tenha a sua sede em Portugal. No plano da Educação, defendemos a consolidação dos programas europeus de mobilidade e o reforço da cooperação entre instituições de ensino dos Estados membros, visando uma melhoria global das competências digitais, na matemática, no domínio das línguas e na filosofia. Consideramos que a autonomia estratégica da UE, nomeadamente da sua indústria, deve passar pela aposta nas competências e na capacidade científica em tecnologias emergentes, tais como computação quântica, computação de alto-desempenho, fotónica e bioengenharia.
XIII
FUNDOS
Para fomentar esta vaga de crescimento, mostra-se fundamental o uso criterioso e reprodutivo dos fundos europeus. Atenta a confluência do PRR e do envelope financeiro do Portugal 20-30, nunca o nosso país recebeu tanto apoio europeu. Trata-se de uma oportunidade única e sem paralelo. A concentração do PRR no sector público e em gastos correntes (pouco ou nada reprodutivos) é altamente censurável e deve ser invertida e compensada através do Acordo de Parceria Portugal 2030, focando-o no apoio ao investimento privado e às empresas (em especial, no segmento dos bens transaccionáveis). Tem de ser agilizada a avaliação das candidaturas a fundos, tornando-os mais acessíveis (em particular para as PME´s) e tem de ser criado um canal de financiamento rápido para os sectores económicos mais afectados com a crise pandémica e a guerra. O planeamento estruturado da alocação de fundos e o escrutínio reforçado da sua atribuição são prioridades indispensáveis ao seu uso reprodutivo.