O mundo em crise e a democracia portuguesa discutidas no segundo dia da Universidade de Verão 2012

O mundo em crise e a democracia portuguesa discutidas no segundo dia da Universidade de Verão 2012

Referiu que as Nações Unidas foram ao longo do tempo perdendo parte da sua intervenção. A este propósito lembrou que os objectivos do milénio dizem respeito à globalidade da terra como casa comum dos homens, lamentando o facto de as Nações Unidas não terem capacidade para fazer cumprir estes objectivos.

Falou da crise e da globalidade que esta assumiu, pese embora a existência de um organismo “ as Nações Unidas estão a transformar-se num templo de oração a um Deus desconhecido. A oração parece não estar a ser escutada”.

Referiu que a maior parte dos estados do Mundo não tem capacidade para responder aos desafios da própria natureza, como disso são exemplos os desastres naturais: terramotos, tsunamis, mas também a Fome e a Miséria.

Continuou dizendo que estamos num turbilhão no mediterrâneo e não sabe se haverá recursos financeiros para enfrentar o imprevisto, se esse imprevisto aparecer. Mudou a circunstância e a ordem mundial. Lembrou que “se lermos o PNUD até ao século passado, a fronteira da pobreza era estabelecida, mas neste momento a fronteira da pobreza ultrapassou o norte do mediterrâneo.” Referiu que aparecem então órgãos que tentam estabelecer directivas em relação ao que é uma anarquia internacional, e esses órgãos não têm qualquer cobertura internacional uma vez que não há um tratado e por isso verificamos a desordem económica e financeira, estando os países debilitados.

Partilhou com os cem participantes desta edição da Universidade de Verão que a relação entre governos e sociedade civil está a ser deteriorada. O tempo político está a entrar em conflito com o tempo civil.

Neste quadro a posição de Portugal precisará de ser avaliada. Continuou dizendo que “esta exigência obriga-nos a meditar um pouco numa espécie de situação portuguesa. Portugal precisou sempre de um apoio externo. Desde os tempos medievais, depois de 1974 só houve o apoio da Europa e esta circunstância colocou na história do país debilidades graves entre o confronto do tempo político e o tempo social.”

Terminou com uma mensagem de esperança, lembrando Bartolomeu Dias que partiu três vezes para a Índia. Rematou dizendo que “nós precisamos de gente que não desista, mesmo que acabe tentando.”

A seguir ao almoço tivemos a aula do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, uma figura incontornável da Universidade de Verão. O orador começou por fazer uma resenha histórica, elencando várias fases da nossa Democracia.

Em primeiro lugar, a política que se fazia na década de 70 e dos agentes políticos de então. Destacou a Igreja Católica; os partidos políticos à data (PS, PPD - enquanto partido de eleitores e militantes, o CDS -enquanto partido de quadros; e as centrais sindicais. Referiu ainda a televisão e a rádio pública enquanto agentes importantes do processo de construção democrática. Continuou, destacando a primeira erupção do FMI nos anos 70 em Portugal, aquando da primeira crise financeira do Estado Português. Lembrou a forma como se fazia política “esta era feita na rua, com a cobertura da televisão e da rádio”. Considerou que politicamente o país estava dividido entre Norte e Ilhas (mais conservadores e católicos) e o Sul (com maior peso dos partidos de esquerda e menos religioso).

Em segundo lugar, a fase entre 1980 e 1985, marcada pelo surgimento da AD, coligação ideológica e de eleitores, num tempo de transição, com o desaparecimento das forças armadas. Referiu a existência de um sistema partidário eleitoral menos polarizado e mais volátil. “Aquilo que era uma realidade antes da revolução, em que não havia volatilidade de votos, desapareceu! A UGT surge como parceira social. A CGTP passa a ser uma grande central sindical no sistema. Diminui a intervenção estrangeira em Portugal, mas o FMI volta a aparecer, nos anos 80, com uma nova ajuda. Aderimos às comunidades europeias.” Referiu ainda que houve uma renovação da Maçonaria.

Numa terceira fase, a década do Cavaquismo, entre 1985 e 1995, destacou a mudança estrutural que houve no país, com a mudança num país até então rural. Terminou o período ideológico da política, referiu. Foi um período preocupado com problemas políticos, sociais, culturais. A imprensa lateralizou a sua acção, com um discurso simples, curto e popular, em torno de termos concretos, problemas das pessoas concretos. Surge a política “anti políticos”, com Cavaco. O PSD atinge o seu máximo de representação com Cavaco Silva, e que nunca mais foi atingida. O PRD sofre com isso, e desapareceu. O CDS sofre o problema de ter que co habitar com uma liderança tão forte. A regionalização conhece a sua primeira morte, quando as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto crescem muito.

Já a quarta fase é a do pós-Cavaco, entre 1995-2005, com o populismo a continuar a subir. “Com novos parceiros a querer aparecer; a mulher ganha influencia, o país urbano é predominante. As áreas metropolitanas multiplicam-se e destacam-se do interior. O PS governa maioritariamente. Nasce o Bloco de Esquerda. A geração anos 70 está a ser substituída pela geração anos 80”.

Numa quinta fase, a do Socratismo e do Novo Século, marcado pela longa governação de José Sócrates. A crise mundial surge, o populismo continua a galopar na primeira fase de Sócrates. Iniciamos uma crise dos partidos, todos antiquados, fazendo retoques e melhorias pontuais, com dificuldade em acompanhar a aceleração. Mas para o orador a crise é também dos parceiros económicos e sociais, uma crise dos grupos económicos, a morte da imprensa, a crise da TV, a Internet passa a ter um papel importante que já tinha avultado durante o Socratismo. Há uma aparente ideologização, mas para Marcelo Rebelo de Sousa passa a viver-se no somatório de conjunturas.

Para o orador a saída da crise vai ser segura mas lenta, não é de um mês para o outro. Apelou à redescoberta de valores, afirmou que se foi longe no domínio da ideologia mas não na doutrina, defendendo a necessidade de novos modelos de vida. Terminou dizendo que “a grande constante da nossa vida é a mudança”.

Ao jantar tivemos a presença do Doutor Miguel Morgado, que é desde 2011 assessor político do Primeiro-Ministro. O orador começou por responder a uma pergunta lançada pelo Director da Universidade de Verão sobre uma das principais bandeiras da JSD, a solidariedade intergeracional. Miguel Morgado começou por realçar a importância deste tema, recordando que tal como a preservação dos recursos naturais é de ímpar relevância, também a sustentabilidade financeira deve ser preservada, de forma a acautelar o futuro das novas gerações. E é nesse sentido que sobeja a regra de ouro, materializada na consagração do limite do défice na Constituição. Esta é, aliás, uma forma de limitar o arbítrio dos governantes.

Recordou que nos últimos anos assistimos à expansão do poder executivo, necessária para dar resposta às necessidades modernas da sociedade, mas que traz limites à liberdade. Defendeu a este propósito uma Constituição aberta para que os diferentes projectos políticos alternativos democráticos possam ser desenvolvidos, sem que a Constituição impeça a prossecução de um programa político sufragado pelos eleitores. Destacou que a regra de ouro não é de esquerda nem de direita, mas que se trata de uma questão de justiça intergeracional, que deverá estar sempre assegurada e ser respeitada.

Prosseguiu, abordando a revisão do programa do partido, onde foi consagrado um novo conceito: o realismo político, que conduz à valorização da responsabilidade política, à orientação da acção política em função dos condicionalismos contextuais da realidade que caracteriza a realidade política. Lembrou que o PSD foi sempre um partido defensor da dignidade da pessoa humana, personalista e lembrando que mais importante do que todos serem iguais é o facto de todas as pessoas serem únicas e irrepetíveis.

Abordou ainda a importância de divergirmos e do debate político, uma vez que tal decorre das diferentes noções que cada um de nós tem das noções de Justiça e de Bem e de Mal.

Terminou dizendo aos cem participantes desta décima edição da Universidade de Verão para que "sejam livres na vossa maneira de pensar".